Você poderia ler todo o texto até que se consumasse a jogada. A cobrança da falta é de longe. A bola é alçada para a área. Ela viaja lenta, frontal, preguiçosa, quase que um pedido de desculpas à defesa adversária. Com exceção de uma camisa verde que arranca atrasada na jogada, são quinze candidatos a aparar o levantamento pisando dentro da área.

Nessas jogadas “desesperadas" e lotéricas de alçar para a área na esperança de que ocorra alguma coisa, é muito comum o defensor emular o movimento de cabeceio pulando o mais alto que consegue enquanto o atacante tenta a mesma sorte. No lance que culmina no gol de empate do Juventude diante do Internacional, o ponto curioso é que apenas o autor do gol, Oscar Ruíz, e o goleiro Daniel têm reação; o primeiro faz o movimento “queixo no ombro" e vence Renê. O segundo pula tardiamente  e vê a bola passar e balançar a rede. Fato inconteste foi a postura passiva de uma bola tradicionalmente fácil de rebater: ninguém subiu senão o atacante paraguaio.

Após somar apenas um ponto numa partida em que esteve à frente no placar durante quase todo o segundo tempo, o técnico Mano Menezes recrutou para a conversa um velho e controverso personagem da vida colorada nos últimos tempos: Moisés. Não me parece uma alternativa válida a ideia de deslocar o contestado lateral-esquerdo para uma posição em que o tempo de resposta para uma falha individual costuma ser zero. Realocá-lo para a zaga seria, a meu ver, uma temeridade.

Se analisássemos o camisa 20 pelo algoritmo da máquina de dados, teríamos grande dor de cabeça; Moisés tem força – dificilmente perde disputas dessa natureza –, velocidade (quando batido no primeiro lance costuma alcançar o adversário) e desarmes em quantidade. O problema é que isso ocorre numa faixa de campo em que se premia a ousadia de tentar roubar a bola, isto é, se o camarada errar o bote terá contra si no máximo uma falta sem cartão, ou um esbarrão no ombro do rival com cobrança de falta com bola rolada para trás. Agora, pense em atacantes leves e velozes com Moisés precisando dar o bote certeiro, cirúrgico, para tirar a bola do vivente e afastar o perigo. Na primeira ou segunda pedalada, o sujeito já estará no chão reivindicando pênalti.

Mano Menezes já acena com Dourado (1,86m) no lugar de Gabriel (1,70m). Vitão, autor do gol contra o esmeraldino, tem 1,85m. Já o uruguaio Bruno Mendéz complica a média de estatura do miolo de zaga com seus 1,80m de altura. Mercado tem a mesma estatura de Moisés, 1,81m, enquanto que Renê – vilão da rodada colorada – e Fabrício Bustos possuem 1,74m e 1,67m, respectivamente. Rodrigo Moledo – que parece ser o único afirmado na temporada mesmo com poucas participações – segue fora por lesão. Ele tem 1,88m e goza de muito prestígio com o treinador. Por outro lado, os grandalhões Kaique Rocha, de 1,97m, e Tiago Barbosa, 1,96m, não são opções a curto prazo. Assim, a curiosa investida em Moisés para resolver a incômoda bola aérea que aterroriza o goleiro Daniel não é garantia de solução. Desviar Moisés de sua atividade-fim, a lateral-esquerda, é, portanto, atraso para o time. E para o clube também, pois sabe que logo ali na frente pode haver debandada do setor por razões contratuais. Azar para o Mano, azar para Moisés, sorte para ninguém. Ah! E a bola levantada por Paulinho Moccelin tá chegando na área.

Rodrigo Rocha

Arte: Rodrigo Rocha

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